quarta-feira, janeiro 18, 2006

Eleições presidenciais

ESCOLHA DECISIVA OU MAIS DO MESMO? A consideração dos cenários da eleição presidencial parece ir ser, agora, o material predilecto dos "analistas". Como se se tratasse de um momento gravíssimo da vida nacional, de escolhas dramáticas entre candidatos e projectos políticos abissalmente opostos e com grande poder de decisão no futuro próximo.
Na realidade trata-se de "mais do mesmo", ou seja, de uma continuidade das escolhas que aos portugueses nos trinta anos de regime democrático têm sido oferecidas: ou um Partido Socialista, o PS que, na verdade na doutrina e na prática é e sempre foi, e tem sido precisamente desde o Dr. Soares, social-democrata; ou de um PSD – Partido Social Democrata – que se afirma social-democrata, vai buscar os votos aos eleitores da direita e tem uma política que não difere, substancialmente da do PS, com excepção daqueles temas – como o aborto – em que a pressão das bases militantes tem sido mais forte.
Também para as presidenciais, e apesar da retórica "apartidária" ou suprapartidária dos candidatos principais – Cavaco Silva, Mário Soares, Manuel Alegre – as coisas são o que são. Cavaco Silva é militante e foi dirigente do PSD; os outros – Soares e Alegre – são do PS; mais à esquerda, Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã representam um outro despique, mais pequeno, mais doméstico, mais local – saber quem tem mais votos na extrema-esquerda e pode hegemonizar tal espaço: se o PC, o velho partido de Cunhal com a sua tradição resistencialista, pós-modernos. Se o BE, dos trotskystas da revolução permanente. Nada de novo, pois, nesta frente "oriental".
Para a direita, que não tem, nem tem tido partido nem candidato, restando-lhe geralmente abster-se, votar no "mal menor" do CDS-PP ou no "mal menor" maior do PSD, nas legislativas, e nos candidatos de "não esquerda" nas presidenciais, a história vai, outra vez repetir-se.
A direita não tem candidato próprio ou pelo menos vizinho. O seu "mal menor" é Cavaco Silva, pelas razões que a esquerda não gosta dele: não foi resistente antifascista, nem sequer da "ala liberal"; passou pelo serviço militar em África quando lhe coube a vez; é um profissional responsável como académico e especialista em Finanças públicas; é um político com bom nome em termos de honorabilidade pessoal e capacidade de entendimento da problemática macro-económica. E é católico, chefe de família e com posições conservadoras quanto a questões como a defesa da vida.
Mas tem uma visão economicista da política; não se tem mostrado sensível ao problema da Nação portuguesa na complexidade e lucidez da União Europeia e, sobretudo, numa Península Ibérica e numa Espanha em vésperas de fragmentação. Escapam-lhe ou não acha muito relevantes os problemas que aí estão, os dos conflitos agónicos da civilização, em que religião, raça, nação, são temas centrais. E é europeísta quanto baste, partidário da Constituição Europeia.
O Dr. Soares está em campo por razões que não são as mais respeitáveis: candidatou-se, ao fundo, porque se maça profundamente, na sua pele de octogenário que não se entretém com as coisas que se entretêm outros octogenários: a família, os netos, a leitura de livros, a escrita de outros, as viagens e meetings com idênticos has-beens, que tanto animam as reformas do ex-políticos, bem mais jovens, como Clinton ou Fernando Henrique Cardoso e Joaquim Chissano.
O Dr. Soares não quis ficar assim e, para se entreter – não há nenhum problema crítico nacional em que o seu específico regresso à vida política possa ajudar – lançou-se nesta campanha. E o PS aceitou-o e endossou-o (também) pelas piores razões: porque o Dr. Soares, sendo uma personalidade política autónoma, de per se, a sua derrota é a sua derrota e só depois a do PS. O que não sucederia com nenhum outro candidato!
Manuel Alegre é de uma esquerda mais genuína, mais ideológica, menos dos interesses e do pragmatismo volúvel de Soares (que passa de Porto Alegre aos seus amigos de Davos, com grande rapidez e à vontade). Tem mesmo, para os nacionalistas (e deixando de lado as questões do passado, entretanto fortíssimas...), uma preocupação republicana e patriótica de defesa em relação à Espanha. Apesar da retórica antifascista será concerteza, se passar à segunda volta, um adversário mais difícil para Cavaco que Mário Soares:
Porque faz, facilmente, o pleno da esquerda. E também pela questão nacional, que lhe dá certa simpatia na direita eurocéptica. Que não a levará a votar nele, mas pode levá-la a não votar contra ele, em Cavaco. O que fará contra Soares, que nas questões europeias e peninsulares é politicamente correcto, isto é pela Constituição Europeia e achando que a Espanha não é um problema para Portugal. E que é um internacionalista convicto.
Quanto ao mais, ideias e programas, há uma enorme semelhança e convergência, na linguagem neutra e politicamente correcta dos candidatos, sendo um destes casos paradigmáticos de que o esforço principal das candidaturas e candidatos será convencer os eleitores do contrário. Senão não terão público, nem mercado. JNP

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