A POLÍTICA DEPOIS DO REFERENDO: ALGUMAS LIÇÕES
Dizia Plutarco de Júlio César, que uma das características da sua “grandeza” era permanecer igual, na vitória e na derrota; não ficava arrogante no triunfo, nem humilhado no infortúnio.
A nossa vida política é capaz de não ser muito fértil em “varões ilustres” à Plutarco. Mas tirando textos mais arrogantes, como o do Doutor Vital Moreira (que consta, melhor que Afonso Costa, vai mesmo acabar com a Religião em Portugal, até 2010...) ou as banalidades sobre a “modernidade” e o século XXI, as reacções foram prudentes.
Como explicar a vitória do “Sim”, quando o “Não” – além da substância - teve uma campanha reconhecida, pelos próprios adversários, como mais fundamentada, estruturada, suportada, em termos dos dados científicos e razões sociais? A intervenção do Secretário-Geral do PS, que também é Primeiro-Ministro, contou, como sempre conta, sobre os indecisos, a voz do poder em Portugal. E veio talvez decidir a competição. Apresentando-se Sócrates, logo depois, não só a cortar “triunfalismos”, como a prometer “remédios” e correctivos para o “aborto livre até às 10 semanas” que o texto aprovado implica.
A cultura de irresponsabilidade, facilitismo, ausência de valores de orientação permanente, hiperindividualismo e o culto de “autenticidade” “faz a cada momento aquilo que te apetece fazer, desde que não vás para a cadeia e não batas na mãe” - o grande “valor” difundido pelo “telenovelismo” - orientou uma massa de gente sem convicções, para o lado que significava a facilidade e os clichés tipo “a modernidade é baril”, “soltem as mulheres”... Como se vivêssemos na Idade Média ou no Estado Talibã, antes de 11 de Fevereiro!
Não é possível, num mês, alterar este estado de coisas, porque o peso dos “indiferentes”, pesa para o “deixa fazer”, mesmo que signifique a “neutralização” de uma vida. E também não sei se alguns malabarismos tácticos, talvez “bem intencionados”, mas que retiraram coerência, princípio e força ao “Não” inspirados pela mentalidade do que é preciso é ganhar de qualquer forma, ajudaram.
O “Não” teve o mérito de trazer para a acção cívica, com sentido de responsabilidade e de combatividade, uma nova geração, que se mobilizou por uma “causa”, lutou com auto-disciplina, espírito de sacrifício e convicções, na defesa dos mais fracos entre os mais fracos.
E quanto à “crise da direita”? Os partidos para o centro do PS – o PSD e o CDS-PP – continuam em “crise”. Embora haja que distinguir que neste caso o CDS-PP esteve claramente com o “não”, enquanto a direcção do PSD deixou “liberdade de escolha”... Como se esta matéria não fosse política. Se não é política, o que é político? A contribuição autárquica? O seguro automóvel?
Se estes partidos não forem capazes de harmonizar a sua agenda com os sentimentos e convicções da direita “sociológica”, e deixar de vez de andar a reboque do politicamente correcto e em permanentes crises de liderança, arriscam-se a contar pouco e cada vez menos, nos próximos tempos. O que é capaz de não ter muita importância..
Jaime Nogueira Pinto – Professor Universitário
Publicado no Expresso a 17 de Fevereiro de 2007
A nossa vida política é capaz de não ser muito fértil em “varões ilustres” à Plutarco. Mas tirando textos mais arrogantes, como o do Doutor Vital Moreira (que consta, melhor que Afonso Costa, vai mesmo acabar com a Religião em Portugal, até 2010...) ou as banalidades sobre a “modernidade” e o século XXI, as reacções foram prudentes.
Como explicar a vitória do “Sim”, quando o “Não” – além da substância - teve uma campanha reconhecida, pelos próprios adversários, como mais fundamentada, estruturada, suportada, em termos dos dados científicos e razões sociais? A intervenção do Secretário-Geral do PS, que também é Primeiro-Ministro, contou, como sempre conta, sobre os indecisos, a voz do poder em Portugal. E veio talvez decidir a competição. Apresentando-se Sócrates, logo depois, não só a cortar “triunfalismos”, como a prometer “remédios” e correctivos para o “aborto livre até às 10 semanas” que o texto aprovado implica.
A cultura de irresponsabilidade, facilitismo, ausência de valores de orientação permanente, hiperindividualismo e o culto de “autenticidade” “faz a cada momento aquilo que te apetece fazer, desde que não vás para a cadeia e não batas na mãe” - o grande “valor” difundido pelo “telenovelismo” - orientou uma massa de gente sem convicções, para o lado que significava a facilidade e os clichés tipo “a modernidade é baril”, “soltem as mulheres”... Como se vivêssemos na Idade Média ou no Estado Talibã, antes de 11 de Fevereiro!
Não é possível, num mês, alterar este estado de coisas, porque o peso dos “indiferentes”, pesa para o “deixa fazer”, mesmo que signifique a “neutralização” de uma vida. E também não sei se alguns malabarismos tácticos, talvez “bem intencionados”, mas que retiraram coerência, princípio e força ao “Não” inspirados pela mentalidade do que é preciso é ganhar de qualquer forma, ajudaram.
O “Não” teve o mérito de trazer para a acção cívica, com sentido de responsabilidade e de combatividade, uma nova geração, que se mobilizou por uma “causa”, lutou com auto-disciplina, espírito de sacrifício e convicções, na defesa dos mais fracos entre os mais fracos.
E quanto à “crise da direita”? Os partidos para o centro do PS – o PSD e o CDS-PP – continuam em “crise”. Embora haja que distinguir que neste caso o CDS-PP esteve claramente com o “não”, enquanto a direcção do PSD deixou “liberdade de escolha”... Como se esta matéria não fosse política. Se não é política, o que é político? A contribuição autárquica? O seguro automóvel?
Se estes partidos não forem capazes de harmonizar a sua agenda com os sentimentos e convicções da direita “sociológica”, e deixar de vez de andar a reboque do politicamente correcto e em permanentes crises de liderança, arriscam-se a contar pouco e cada vez menos, nos próximos tempos. O que é capaz de não ter muita importância..
Jaime Nogueira Pinto – Professor Universitário
Publicado no Expresso a 17 de Fevereiro de 2007
6 Comentários:
«Como explicar a vitória do “Sim”, quando o “Não” – além da substância - teve uma campanha reconhecida, pelos próprios adversários, como mais fundamentada, estruturada, suportada, em termos dos dados científicos e razões sociais?»
Explicação óbvia: Os votos valem mais que as campanhas.
Explicação esotérica: Nem todas as «razões sociais» são apregoadas por toda a gente. Os questionários do género «já interrompeu uma gravidez?» são um pouco como aqueles questionários dos anos 60 sobre a vida sexual das donas de casas, em que se depositava uma enorme confiança. Ou se preferir, talvez como aquelas respostas que os brincalhões dos samoanos davam à jovem e ingénua Margaret Meade...
Upa lá, que aqui saiu erro grave, daqueles que mudam tudo: onde está «donas de casas» leia-se «donas de casa».
Fiquei contente com a vitória do "Sim"...Espero que o "Sim" vencedor seja prudente e ponderado.Espero, mas, infelizmente, não acredito que o venha a ser.
A frase "Bem vindos ao sec. XXI" foi, sem dúvida, a frase mais infeliz usada no referendo.Tendo sido usada para celebrar a vitória do "Sim" esta frase chega, na minha opinião, a ser sinónimo de uma certa perversidade visto que tenta transformar a vitória do "Sim" no advento da modernidade...
Concordo consigo quando diz que a intervenção de José Sócrates teve um papel importante na vitória do "Sim"...Anseio ver em Portugal um referendo sem a preciosa orientação dos partidos (e, porque não, da Igreja).
Cumprimentos,
Max Mortner
(www.guardafiscal.blogspot.com)
"Como explicar a vitória do “Sim”, quando o “Não” – além da substância - teve uma campanha reconhecida, pelos próprios adversários, como mais fundamentada, estruturada, suportada, em termos dos dados científicos e razões sociais?"
Discodo em parte. Pode ter tido uma campanha mais estruturada ao nível institucional ou "físico", se quiser. No entanto, penso que do ponto de vista ideológico foi bastante polarizada. Pode ver a minha opinião em:
www.causaidentitaria.org
Com os melhores cumprimentos,
Afonso Lima
Peço desculpa por me estar a repetir, mas não posso de deixar de concordar na totalidade, quando diz:
"Como se esta matéria não fosse política. Se não é política, o que é político? A contribuição autárquica? O seguro automóvel?"
Pois é, caro amigo! Essa foi uma das armas do "Sim", ou da Esquerda Caviar-Militante. Por isso é que digo que o "Não" não esteve totalmente bem estruturado, faltou-lhe a prática política, e quando essa falha, todos sabemos no que resulta.
May You are"politically"right,but this issue for me,was metapolitical.Cumprimentos.
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