terça-feira, outubro 03, 2006

Le Carré no coração das trevas

O novo romance de John le Carré, The Mission Song, leva-nos à África de hoje, recriada no lugar imaginário e inspirado de outros grandes escritores em loci africani - como o Conrad de Heart of Darkness e o V.S. Naipaul de A Bend on the River.

Mantenho a minha opinião, de "longa duração", de que John le Carré é além de um dos responsáveis pela passagem da spy novel à categoria de "literatura" tout court, um dos seus mestres. Mas o seu talento está ligado aos tempos da "guerra fria", em cidades como Londres, Berlim, Bona, Praga. Isto é no ciclo de Karla versus Smiley, com os snobs e os plebeus do "Circo", os aparatchiques do Leste, os "dragões britânicos", os "primos" da CIA. As suas incursões nos trópicos e mesmo no Médio Oriente - como The little drummer girl - nunca me convenceram.

Depois as suas obcessões de fazer "vilões" ex-aequo com os soviéticos - a elite britânica, os seus clubes, os seus funcionários de Whitehall, os americanos, sobretudo os quadros de Langley - às vezes tocam a correcção política, numa equivalência moral que em fim de contas é falsa.

Mas a RDC-Congo tem potencial para reviver essas novas epopeias "africanas" do tempo das Quimeras Negras de Lartéguy ou dos Dogs of War do Forsyth. Naquele quadro David-Golias - um herói alegre, bravo, atirado para a frente - (Smiley era bravo e determinado, mas é difícil imaginar alguém mais triste) contra a "liga dos malvados". Aqui espiões e mercenários ocidentais, capitalistas dos recursos, warlords e políticos locais: tudo perverso, maquiavélico; todos ávidos, corruptos, sem escrúpulos. Vamos ler e depois damos notícia.

1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Caro Jaime Nogueira Pinto,
Excelente post.
Não consigo concordar consigo sobre a sua apreciação sobre "A rapariga do tambor", acho que tem das mais inteligentes descrições sobre o que é representar um papel e a certa altura começar a encarnar a personagem. Para além disso, o Líbano parece-me descrito de uma forma imorredoira. Acrescentaria à sua lista "O espião que veio do frio", e claro que acho que a profundidade do autor advém, em grande parte, de não encontrar "bons", o relativismo moral que tanto critica.
Sobre literatura e espionagem, gosto particularmente de um livro de outro autor, que lhe aconselho, no caso improvável de não o ter lido, "A segunda morte de Ramon Mercader" de Jorge Semprún.

sexta-feira, outubro 06, 2006 11:55:00 da manhã  

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